quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

"Porque quem entende desorganiza"

"É como doido que entro pela vida que tantas vezes não tem porta, e como doido compreendo o que é perigoso compreender, e só como doido é que sinto o amor profundo, aquele que se confirma quando vejo que o radium se irradiará de qualquer modo, se não for pela confiança, pela esperança e pelo amor, então miseravelmente pela doente coragem de destruição."

"...nossa grande luta é a do medo."

Clarice Lispector é isso. E é genial!

Sinto
Penso
Escrevo

Não necessariamente nessa ordem!

Necessariamente.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Roda Vida

Engraçado que era um dia tão ruim
E você simplesmente o encheu de luz

Era uma vida tão igual
E você mudou tudo de lugar
Tirou alguns acentos
E colocou pingos em alguns "i"

Era tudo só silêncio
E você me aplaudiu ao me ouvir cantar

Era tudo só papo vazio
E você levantou a bandeira vermelha
Falando justamente do que eu gostaria de lutar

Era tudo tão comum
E você foi mais longe que qualquer outro

E você que simplesmente me olhou!?
E, ao me acompanhar,
criou um mundo novo!
Onde sou rainha, princesa e eu.
No mais cru do que é ser eu.

Era tudo cinza
E você, azul que é, me telefonou
E me abraçou!

Teve você que lembrou de mim
E você que me elogiou
E de novo você,
Onde só havia esquecimento e desilusão,
Que sempre esteve lá.

Onde o passado morrera
Teve você que voltou
É festa no lar!

O nome disso é amizade
Alguns amores também
Mas mesmo quando me esforço para ficar só
E matar o que há de mim em todos vocês
Sei que são exatamente o que preciso para me sentir viva

Se um dia eu conseguir cometer tal suicídio
Me perdoem!
É que vocês me tornam tão grande
E tão feliz
Que mal caibo em mim

E não há perigo maior
Que eu fora de mim

Mas adoro sair!

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Holofotes, verdades e razões

Hoje não vou postar um texto meu. Acho que não ando muito inspirada. Ou estou tão cheia de ideias na cabeça que suplantaram meu talento de colocá-las no papel. Mas recebi um e-mail tão perfeito, que dizia tantas coisas que penso, que me sinto na obrigação de aqui colocar!


"Foi a cena mais dramática que já assisti em toda minha vida. As águas levando pouco a pouco o que restava de um terraço de uma casa e a senhora, desesperada, agarrava-se a um cachorro , que a correnteza também levou. Felizmente, essa senhora foi resgatada com vida por seus vizinhos. Contudo, a marca da destruição acompanhará essa e todas as outras vítimas dessa tragédia. Em momentos como esse, o script é o mesmo: emissoras de televisão brigam pela audiência buscando o melhor ângulo da desgraça; políticos se prontificam a consertar o mundo em um passe de mágicas; especialistas se debruçam em soluções anunciadas. Não há dúvidas que providências imediatas precisam ser adotadas nessas áreas reconhecidamente críticas, como é o caso dessas regiões serranas. Todavia, qualquer medida será ineficiente se não houver uma mudança radical nas relações sociais e com o meio ambiente.

As autoridades governamentais são unânimes em afirmar que as tragédias decorrem de uma fúria incontrolável da natureza. De fato, à inocência da observação leiga, já é possível aferir o quanto os fenômenos naturais andam desajustados. No entanto, dissimuladamente, pouco se questiona sobre o motivo desse desajuste. Essa omissão não é conivente apenas para os políticos, que certamente deixam de cumprir suas mínimas obrigações. Para todo nós, atores desse modelo de sociedade falido, é mais cômodo não refletir sobre as causas dos colapsos. Nosso egoísmo capitalista se contenta com a comoção midiática e com os apelos hipócritas pela solidariedade.

Há poucas semanas comemorávamos a consolidação do Brasil como oitava economia mundial em 2010. Hoje, ironicamente, contabilizamos o tamanho da catástrofe com a mesma desestrutura e desespero com que o Haiti, o país mais pobre da América Latina, o fez após o terremoto do ano passado. Esse contraste é apenas mais uma evidência de que o aumento da riqueza material desvinculada de uma elevação do nível sócio-cultural da população, uma ação governamental contínua e uma política ambiental efetiva não passa de uma grande ilusão. O que se desnuda aos poucos por meio da imprensa é que, de certa forma, a grande intensidade das chuvas na região afetada havia sido detectada previamente pelos institutos de meteorologia.
Portanto, o argumento da surpresa e da imprevisibilidade da força da natureza se arrefece. E, inadiável se torna a necessidade de se analisar a inércia de todos diante do alerta que só foi divulgado depois de tantas mortes.

É indubitável que o Poder Público falhou. Todavia, os meios de comunicação, que agora esbravejam contra a lógica da ocupação desordenada de encostas, têm que explicar porque não divulgaram essa previsão meteorológica com a devida importância. A própria população tem que refletir sobre o seu papel de contentamento diante dos lixos oferecidos pela mídia. As autoridades não agiram previamente porque não podem se indispor com as grandes empreiteiras que sustentam as campanhas políticas e que conseguem viabilizar qualquer projeto que apresentam junto às prefeituras. Não agiram porque sabem que a ações emergenciais tomadas em situações de calamidade tem muito mais visibilidade que a execução de projetos de longo prazo. Não agiram porque apostam na conhecida e terrível “curta memória” do brasileiro. Os meios de comunicação não apontaram esses problemas previamente porque também dependem do dinheiro das campanhas publicitárias das grandes empreiteiras. Não aprofundaram na inércia do Poder Público porque defendem interesses de determinados projetos políticos. Não deram o espaço devido com reportagens e análises sérias porque não teriam audiência. E não teriam audiência porque para a grande massa alienada é mais interessante assistir ao circo criado pelo Ronaldinho Gaúcho e seu irmão ou discutir as brigas e intrigas do deplorável reality show. É nesse sentido que retomo a idéia inicial de que os mais de 500 mortos na região serrana do Rio de Janeiro são resultado de uma falha coletiva, de relações sociais e políticas corrompidas e de uma grande população desprovida de capacidade crítica, que se seduz com a satisfação efêmera do consumismo.

Enquanto a sociedade não for dominada por cidadãos conscientes de seu papel coletivo e com destreza para se articular e adotar medidas em prol do bem comum, assistiremos continuamente ao surgimento de novas vítimas das mazelas e do oportunismo. Como escreveu Pablo Neruda:
‘Algo así le pasa también
al hipotético político
que conduce sin conducir
a multitudes invisibles.’”

(João Paulo de Souza Andrade)